terça-feira, 10 de novembro de 2009

O JOVEM RICO


MATEUS 19:16
com referências de Marcos 10:17 e 14:51



Eu era apenas um jovem.


Muitas dúvidas, anseios, pensamentos e buscas incansáveis.

Eu vinha de uma boa família: Meu pai, sempre presente, reservava horas do dia para me disciplinar e ensinar a cuidar dos nossos bens. A sua hora havia de chegar e caberia a mim cuidar do sustento e de meus irmãos menores. Dois grandes lotes. Nosso gado pastava em um lado enquanto as tâmaras e oliveiras cresciam no outro pedaço de terra. Minha mãe era doce e reservava pra mim seu melhor sorriso. Seus olhos cansados escondiam sua beleza ainda jovem. Tínhamos empregados, mas como era muito humilde, fazia questão de dividir as tarefas de casa com as serviçais, que no final das contas se tornaram suas amigas. Mamãe tinha sempre um beijo e um carinho na cabeça. Mas fui crescendo, os beijos se tornaram mais tímidos e os carinhos beliscões... mas era a mesma mamãe que me ensinou a amar a todos como membros da minha família.

Ouvi falar de ti várias vezes.


Da sua voz, suas maravilhas e do reino ao qual ainda não havia ouvido. Da salvação, da vida eterna, do amar ao próximo como a si mesmo... meu Deus! A minha vida se tornou apenas razoável depois que eu tive conhecimento das tuas palavras.


Não foi difícil te encontrar, pois por onde passava levava multidões, além do burburinho que ecoava pelos becos quando chegava à cidade.


Estava um tanto temeroso em dar uma palavra em tua direção, mas você se virou pra mim como se soubesse que eu iria te perguntar algo. Não tive saída!


Te chamei da mesma forma como os que estavam junto a nós te chamavam: Mestre!


Confesso que por várias vezes fui arrogante, talvez contigo eu tenha sido, mas era uma forma de me proteger e transparecer uma falsa idéia de “dono” de mim mesmo.


Seu timbre de voz era acalentador como o de mamãe, mas havia força e poder como a voz de papai.


Você me pareceu dar conversa à minha ingênua pergunta, tanto é que me perguntou de volta e prolongou um pouco mais aquele maravilhoso momento.


Mas mestre, fui pego de surpresa pelo que me propuseste.


E a minha reação não foi a das melhores.


Me entristeci, pois fiquei sem resposta.


Como eu poderia deixar tudo o que eu tinha?


Poderia até te seguir, mas jogaria todo o tempo de meu pai pro alto?


E minha mãe? O primogênito sair de casa e derrubar por terra todos os planos de meus pais... para ela seria um absurdo!


Então cabisbaixo voltei pra casa. Mas suas poderosas palavras nunca voltam vazias, e hoje eu sei o que tu querias dizer com aquilo.


Naquele momento o meu exemplo seria lição aos que estavam juntos a nós.


E tenho certeza que muitos como a mim rejeitariam o que me disseste.


Mas a tua misericórdia é eterna, e sei quanto é valiosa uma alma para ti, senhor.


Na verdade tu conhecias o meu coração e sabia que depois de tudo eu iria pensar no que me disseste.


Não era vantagem para ti me fazer afastar.


Quando caí em mim, comuniquei aos meus pais que pegaria o que me pertencia para vender e assim dar aos pobres.


Por um momento riram achando que era brincadeira ou que havia pegado muito sol e estava ficando louco.


Mas depois de olharem as minhas mais caras túnicas expostas no chão do nosso pátio de entrada, meus braceletes de bronze puro e minhas botas de couro vindo da Síria, além do meu pote de pedras semipreciosas delicadamente esculpido por algum nobre artesão grego, tudo exposto à venda, a raiva invadiu o coração de meu pai e a tristeza tomou conta de minha mãe a ponto dela se agarrar em minhas pernas.


Mas de nada adiantou.


Aquelas palavras ainda ecoavam em minha mente. O amor que eu sentia por ti era imenso. Queria te seguir e ouvir mais e mais o que teria pra me dizer!


Arrecadei o bastante, confesso. Só fiquei com um denário para partir em busca de ti. O resto dividi com quem realmente precisava.


Mestre, você tinha que ver os olhos daquelas crianças, homens e mulheres quando eu lhes entregava as moedas de prata!

Segui seus passos. Pelo menos tentei.


Já havia passado um bom tempo desde aquela primeira vez que estivemos juntos.


Lamento por eu ter demorado tanto!


Fui lhe procurar um dia e meus passos cruzaram os teus.
Fui lhe mostrar que eu tinha vendido tudo! Nem roupa do corpo eu fiquei!

Mas o povo me reconheceu e me trataram mal depois do que me disseste. E vi, mestre, Que nem todo mundo que te segue te imita.

Saí correndo, nu. Como vim ao mundo fiquei, sem nada!

Mas não desisti do Senhor.
Dei mais um tempo para te procurar novamente.

A última vez que te vi tu estavas sangrando!


Haviam cuspido em tua face, aquela coroa devia estar doendo bastante em sua testa. E os cravos... meu Deus! Eram maiores que meu palmo aberto!


Mestre, o que fizeram contigo!


Te colocaram entre ladrões.


Mesmo daquele jeito tu não fraquejaste as pernas.


Tu estavas forte até o último suspiro. Vi seus lábios mexerem como se falasse aos céus algumas palavras. Como eu queria ter escutado tais ricas palavras! Palavras do meu Senhor!


Dei as costas antes de chegarem com uma lança perto de ti. Não quis ver tal cena.


Mestre. Vaguei sem destino.


Não voltaria mais pra casa. Minha mãe talvez me recebesse, mas papai... Não. Papai não aceitaria minha volta.


Não comi durante três dias. Dormi nas vielas e me confundiram com os beberrões e leprosos. Pedi abrigo numa daquelas pequenas casas em que deixei minhas moedas e mesmo assim não me receberam.


Me humilhei.


Mas não importava, o pouco que estive contigo muito ganhei, mestre.


Meu coração disparou quando vi uma mulher gritando que o Rabi havia voltado.


Mestre, tu voltaste à vida!


Sim, eu soube!


Mesmo sem te ver o meu coração afirmava que tu estavas entre nós novamente.


Era como se algum espírito, ou melhor, algum Santo Espírito tivesse explodindo em meu peito, confirmando que tu és eterno.


E isso me respondeu aquela primeira pergunta que eu te fiz: “que bem farei para conseguir a vida eterna?”


Sendo assim voltei pra casa. A raiva de meu pai havia terminado e não havia mais a timidez em minha mãe e ela me abraçou e me beijou como antes!


E na verdade o bem maior que eu tenho, a maior riqueza, meu maior patrimônio é a tua palavra em meu coração. E essa continuo a dar de graça aos pobres de espírito, pois a mim foi dada de graça.


Obrigado, mestre.


Deixei de ser um egoísta jovem rico, para ser um próspero homem cheio do Seu Espírito.
Além do mais, tudo isso me prova que o Senhor não faz acepção entre pessoas.
Jesus.Glórias ao teu santo nome!


Alexandre Monsores

O Último Discípulo


ATOS I: 21 a 26.


Ah, aqueles dias!
Apenas mais um pequeno e magrelo menino que ficava pelos cantos murmurando sua má sorte.
Ninguém dos que viviam em sua rua se interessava por trocar meia dúzia de palavras comigo.
Durante os momentos de lazer, raros eram as vezes que me escolhiam para jogar “carimba”. Quando eu mesmo não levava a bola feita de bexiga de boi cheia de areia que meu pai havia feito, eu era deixado de fora da equipe e apenas assistia os meninos jogar várias partidas de episkiros”.
O único jeito era pegar a minha “pandorga” e empina-la aos céus por entre os pássaros... Ah. Aqueles dias! Quisera eu ser um daqueles pássaros!
Cresci achando que o futuro eu é que fazia.
Tinha certeza que meu suor e meus calos me trariam a sorte, ou melhor, eu a compraria.
Sorte? Pra que sorte?
Destino? Eu faço o meu destino!
Coloquei em minha mente o que faria nos próximos anos e, sem intervenção de ninguém ou nada, seria um homem chamado para o sucesso apenas com o meu próprio esforço.
Mas minha insegurança falava mais alto.
Eu me lembrava do velho menino. E por mais que você nos falasse sobre viver cada dia com o seu mal, me preocupar com um certo reino nos céus e uma vida eterna... Mestre, eu me achava fraco para tudo isso.
Eu adorava as história sobre Davi. Como Deus escolheu aquele jovem, dentre todos os fortes filhos de Jessé, para torná-lo um grande rei. Isso sem falar do próprio Samuel, que ainda menino o Todo poderoso o separou para o árduo chamado de profeta.
Ouvi falar de um tal Gideão que, de pequeno se tornou um nobre guerreiro e vi, com os meus próprios olhos, o carinho que Tu tiveste com Zaquel, pequeno em estatura.
Mas o máximo que estaria preparado para mim eram os meus planos.
Tentei comercializar madeira, mas eu não era tão bom com as palavras e poder de convencimento assim.
Tentei pescar, mas eu era muito impaciente.
Construir casas... isso nunca! O ofício de pedreiro era muito pesado pra mim.

Só me restou somar, agradavelmente, aos quase cento e vinte homens que Te seguiam, foram três anos e meio até chegar o momento.
Aquele dia nunca vou esquecer.
O mais importante de minha vida.
Eu e meu amigo José, o Barsabás, nos apresentamos a Pedro. Foi aí que eu percebi que já havia tanto tempo que Te ouvia e seguia Teus ensinamentos, desde Teu batismo até a subida aos céus.
Quanto tempo...
Mas é assim mesmo: quando é agradável de se estar, o cronos acelera sua covarde contagem e não percebemos que os dias passam num piscar de olhos. Ao contrário do momento da angústia, em que o mesmo cronos se esquece de mover.
Pedro orou.
Senhor, o que estava preparado pra mim?
Eu já havia voltado a pensar sobre as madeiras que haveria de vender, criando novamente meus planos para o futuro, e, de repente sou surpreendido pelo Teu querer?
Alguns de nós separaram uma moeda para jogar à sorte. Outros pegaram dois gravetos de tamanhos distintos para escolhermos, mas foi o próprio Pedro que pegou algumas pedras pretas e uma branca e as pôs dentro de uma sacola de estopa.
Um de nós haveria de pegar aquela pedra branca.
A cada pedra que tocávamos uma gota de suor escorria por nossas testas.
Nós nos entreolhávamos e sorríamos sem graça, e Pedro, somente segurava a sacola que a cada momento ficava mais leve.
Será que seguiríamos os passos do outro? Aquele louco! Perdão, Senhor. Mas é difícil de perdoá-lo! Por que, Judas? Por quê?
Pronto! Era dado o momento. Quando olhei meu punho aberto ali estava ela: a pedra branca.
José correu para os meus braços e me beijou a face e disse: “Boa sorte, grande amigo!”
Sorte? Senhor! Realmente Tu sabes o que fazer para nos preparar para o Teu propósito.
O que Tu viste em mim, Jesus?
Quem diria... Um dos doze!
O pequeno Matias!



Texto escrito por Alexandre Monsores, inspirado em ATOS I, quando Matias é sorteado para ficar no lugar de Judas, entre os apóstolos.